terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

PARTE II

Penélope já havia viajado bastante de trem. Os negócios do pai a obrigavam a viajar constantemente. Era o preço que pagava por não ter mais a mãe, que com certeza obrigaria o pai a se fixar em algum lugar. Depois de um tempo viajando acompanhada do pai, ela desistiu de exigir sua presença. Ele sempre tinha que ir e voltar para buscá-la. Isso resultava em sua cara sempre emburrada porque estava atrasado. Agora ela já tinha oito anos e sabia que poderia pegar o trem sozinha. Aparentava até ter mais idade, já que era a mais alta de todas as turmas que freqüentou.

Há alguns anos ela havia mudado de novo de opinião quanto a graça de cada viajem. Antes, o legal era apreciar a paisagem que se movia rápido pela janela. Quando era ainda menor, gostava de observar os desenhos que as nuvens formavam. Agora, o interessante era quem se conhecia dentro do trem. Era uma espécie de brincadeira pessoal. Parava um minuto a porta escolhendo com quem conversaria desta vez.

Olhou atentamente avaliando cada pessoa. Uma moça sentada sozinha lhe chamou a atenção. Parecia estar nervosa a julgar pela força que segurava um livro. Era engraçado pensar que uma moça daquela idade (seja qual fosse) pudesse ter medo de andar de trem. Deu alguns passos e na sua delicadeza sentou-se ao lado da mulher. Começou a olhar a forma como esta acariciava a capa do livro. Achou graça nisso também.

-O que tem na sua mão?- ela perguntou cheia de curiosidade. Deveria ser algo importante para ela segurar daquela forma.

-Como?- a moça pareceu surpreender-se com a menina lhe dirigindo a palavra.- Como você pode ser tão pequena?

-O que tem em sua mão?- Penélope agora podia ver o título do livro. O general e a lira. Parecia um livro para adultos daquele tipo com histórias chatas.

- Mas você é tão pequenina!

A menção ao seu tamanho incomodou Penélope. Não gostava que lhe julgassem pequenina e frágil.

- Eu não sou pequena. Fique você sabendo que eu sou a maior da minha turma, e eu ainda só tenho oito anos. Espere para ver quando eu estiver da sua idade. O que tem na sua mão?

A menina ainda queria saber o motivo daquela mulher carregar aquele livro.

-Nada.- respondeu a mulher virando a cabeça para o outro lado.

O trem começou a andar, fazendo os barulhos de sempre. A mulher fechou os olhos e Penélope achou que ela estivesse com medo. Colocou suas mãozinhas sobre a da mulher, em um impulso que não soube explicar. Queria que tivessem feito o mesmo por ela quando sua mãe morreu.

-Que foi?- a mulher pareceu confusa.

- Esse barulho! – E colocou as mãozinhas nos ouvidos juntamente com as mãos da mulher. Se ela fingisse que também tinha medo do trem, a mulher se sentiria mais confortável.

- Shishishi...- fez a mulher, encostando a menina no seu colo, de uma forma agradável como a muito tempo ninguém o fazia.

- Como você se chama?

-Naadi, e você?

Penélope não respondeu. Não gostava de dizer seu nome porque sabia que na próxima estação seu acompanhante desceria e esqueceria de vez seu nome. Era um nome muito bonito para se esquecer.

E nos braços daquela estranha, a menina pode perceber como sentia falta da mãe. Sentiu uma imensa necessidade de ser amada de novo.

-Você gosta de mim?- ela perguntou meio tímida, num tom baixo de voz.

-Sim – Naadi pareceu hesitar, falando numa voz mais baixa ainda.

Penélope sorriu e juntou seu corpo ao da mulher mais forte ainda. Aquele “sim” havia lhe trazido ao estado de antes. O trem deu um solavanco e a menina se agarrou com mais força.

- Shishishi...

-Já esta chegando?

- Sim querida.

Uma pena. Ela queria que aquela viajem durasse para sempre.

Paola Carleto


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